quinta-feira, 7 de maio de 2015

Hora de Glória (Ano Azul)

Dia raiou, era pra ser mais um, ainda não dava pra saber, mas aquele dia, apesar de não ser, seria o vinte e um. Era um dia comum, mais outro, que fosse o que tivesse de ser. Era isso que entoava na mente quando o sono se desfez; havia tanta coisa pra resolver, que ainda não era hora de se preocupar com o grande evento do domingo. Era um dia de glória, só que não tinha como saber ainda.

Da cozinha pra varanda olhar o céu, deixar a vista se perder no azul, numa oração pra trazer boas vibrações, e aí os olhos se voltaram pro campo que despertava tanto amor.
Já estava tudo pintado, o palco todo preparado: a âncora que estava tatuada, literalmente, no peito, também decorava o centro do campo; era mais uma batalha, mais uma em que tudo seria doado em campo.

Equipamentos, bicicleta e fones de ouvido, cada pedalada trazia um pouco de paz pro coração que já estava tão tranquilo. Chegar cedo sempre foi bom. É verdade que existiam tantos afazeres, mas no geral era tão bom ocupar a mente, pra não deixar o frio da barriga anterior voltar a tomar os pensamentos. Fazia quantos anos que sentia aquilo em toda véspera de jogo? Três anos? Quatro anos? Não importava, sempre iria sentir aquilo, porque no momento que deixasse de sentir, sabia que era o dia em que não mais se importava, e que assim, não deveria mais ter direito a um uniforme azul.

Enquanto as pendências eram resolvidas, o lado jogador foi esquecido, como sempre. Agora era diretor e tinha responsabilidades maiores. Organizar tudo e, pela primeira vez, não houve o clima de correria, de afobação.
Almoçar com os companheiros foi mais uma das sensações inéditas daquele dia; trazia uma sensação familiar, uma leveza que era fruto da harmonia que havia bem lá dentro, no coração e na alma.

A volta pra casa foi ainda mais tranquila, poderia ficar no vestiário, entretanto não há lugar melhor que o lar pra relaxar. Músicas escolhidas especialmente, um banho gelado pra levar pra longe o calor e qualquer sensação ruim. Relaxar nunca foi tão fácil, principalmente com o e-mail dela que chegou.

Uma última checagem nos afazeres de diretor, e mais uma vez, adiantando o cronograma previsto, agora só restava o papel de jogador.
Roupas de aquecimento, alguns equipamentos velhos, a maioria dos que vestiu eram novos e azuis, todos pra que aquela temporada fosse diferente, e dentre tudo que carregava, as duas maiores mudanças naquele dia eram: o Tal novo que carregava no pescoço, uma lembrança da promessa pra tudo que viesse a realizar, e principalmente a sensação que tudo estava onde e como devia estar, uma harmonia própria que não conseguia explicar.

A concentração chegou no auge. Dedos enfaixados pra prevenir antigos e novos entorses; os últimos detalhes dos equipamentos devidamente ajustado e um uniforme azul que fazia tudo mais adequado. O vinte e um tatuado abaixo da âncora, agora destoava no azul das suas vestes. Havia orgulho daquele número, orgulho de todo o significado que existia no seu padrão.
Um suspiro longo e estava pronto. Discursos entoaram ao redor, contudo, nenhuma palavra que dissessem faria diferença àquela altura: tudo já estava na cabeça, faltava apenas uma última parte, a benção pra que tudo desse certo.

De joelhos, como todos no recinto, com uma mão no ombro de um irmão, a oração foi entoada. Mas dessa vez a imagem visualizada nos olhos fechados foi diferente: havia paz, daquela que só se faz, quando se está tudo bem e o que havia além, era um bom azul. O grande ótimo azul. As preces dos irmãos ao redor seguiam firme, enquanto a mente miravam o que viria a frente. Um novo desafio a superar, tudo ia ser deixado em campo, era missão e obrigação.
Foi aí que uma situação inédita surgiu: o campo sumiu, e na mente surgiu apenas o azul, representado no mar. O mar que dava nome ao time, o mar que era tão importante em tudo que já vivenciara. O mar que ela havia prometido compartilhar. O azul que ela havia informado que seria a ponte pra tudo de bom que viesse daquilo tudo que estava surgindo.
E quando a oração mudou, o mar se tornou céu, de um azul tão bom, que não tinha como duvidar que o futuro seria igualmente positivo. Ao fim, antes do amém, o que fazia mais bem, além de todo azul, era o rosto dela, o rosto e o riso cru. Que saudade! Que vontade! E dava pra sentir toda as energias boas que ela enviou logo cedo, tanto que tudo transbordava quando o campo foi pisado pelo pé direito.

Um último olhar pro céu, um indicador praquele que era metade e pra sempre iria ser. O jogo começou. Era mais um, como todos os outros que já haviam passado, como todos os treinos durante a semana. A primeira participação passou, tranquila, apenas tinha de fazer o seu trabalho e era o que iria ser feito.

Treino duro, trabalho duro, tanto tempo abdicado e nada disso passava pela cabeça quando o momento chegou. Tão rápido, tão súbito, reflexo de tudo que se acumulou e foi aí que o momento sonhado finalmente chegou.

A hora de glória chegou. Foi rápido, fugaz e um pouco doloroso. A costela doía da pancada que veio no fim da conquista; a adrenalina ainda era muito forte e quando os irmãos chegaram para parabenizar, não sabia bem o que falar, apenas queria continuar ali. Tinha ensaiado tantas vezes aquele momento na mente, sonhado tanto, e quando finalmente chegou, nada foi como o planejado. Estava cansado, felizardo, realizado e principalmente impressionado. Porque ali, o que mais lhe vinha a mente era a sensação de que era só o começo, que uma aura boa atraí coisas tão boas que correspondem ao que se planta; ali era melhor do que a imaginação jamais fora capaz de conjecturar; ali, leve como estava, toda a aura boa que trazia dentro do peito e que ela enviara, se consolidara naquela conquista pessoal tão incrível.
Foi a primeira glória do dia e os irmãos seguiram o seu caminho como inspiração. Uma apresentação memorável, como nunca havia vivenciado. Tudo foi se consolidando naquela tarde única, quase perfeita, e só não o foi, porque sempre há o que se melhorar, e dava pra perceber que ainda tinham um longo caminho a percorrer. Ao fim daquela jornada, quando a lua já despontava no céu, veio a chuva. Que tinha de vir pra molhar, pra lavar, pra mostrar que o céu viu tudo, que estava ali de testemunha de todo o trabalho duro e a recompensa que finalmente havia chegado.

Nunca ousem acreditar que não chega, porque chega. Todo trabalho duro recompensa, principalmente se existe crença e aura boa. Foi assim comigo, mas foi só o começo. É um ano azul que está vindo, é um ano azul que o sorriso dela vem me trazendo todos esses dias e que me levará pra tantas outras vitórias e glórias de chegar. Um ano azul meu, um ano azul dela, quiçá nosso e de todos ao redor que quiserem pegar carona. É um ano azul que eu quero e que construo, um ano entre risos e glórias, um ano pra entrar pra história.

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