quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Inventário

Todas as artérias sentimentais não param de buzinar: é o trânsito infernal de pensamentos inócuos, clamando por você e nem posso parar pra me organizar, já que sou tragado e arrastado pela sutil correnteza dos rios temporais, buscando abrigo nas pontes dos nossos encontros casuais, tentando resistir a esperança de reencontrá-la sem um aviso prévio, sem ter de agendar um papo na sua rotina acelerada.

Célere, eu costumava a ser, quando, em outrora, era comum mover-me em silêncio; cada movimento, agora, pesa uma tonelada, são tantos sentimentos que nem mesmo seria o bastante, se no meu peito fizesse um inventário.
Inventei então, um personagem qualquer para participar desse mundo moderno e como nesse famigerado jogo dos egos, expressar seus próprios sentimentos é sinônimo de jazida, com o conhecimento fúnebre de quem foi seu algoz, já perdi a conta de quantos órgãos do peito esquerdo me foram desfigurados; minhas bombas de sangue me são rapinadas e é assim que a vida seguiu, até então.

Entorpeço-me com uma súplica torpe feita à cruz presa ao pescoço. Posso apenas olhar com descrença a estranheza de fazer parte disso tudo. Sobrando-me maturidade, forço-me a admitir que, talvez, isso seja tudo reflexo porque eu fiz tudo que queria fazer, deixei até o sistema me usar como tinha de ser, quantas, tantas, machuquei em busca do meu bel prazer? Não retruco, assim, pela falta de você. Sigo, sem lhe avisar, para o centro da cidade que inventei como meu coração e, entre casarões desertos, o maior ainda tem espaço pra você.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Pra Agora

Inundado pelo frevo,
Com fanfarra a sua volta,
Eu gritei seu nome,
Ostentando riso no rosto.

Dizem que o mundo é vazio,
Mas nesses quatro dias,
Onde quem reina é a folia,
Não há sentimento frio,
Sobra mesmo é alegria.

Eu era sincero,
Fiz do amor minha escolta,
Do 'nós' o melhor pronome,
Ansiando seu beijo com gosto.

Eu estou tão bem,
Estava lá fora,
Perambulando as ladeiras,
Procurando a casa nº 100.

A mesma do nosso passar hora,
Aquela antes de você ir embora,
Estou saudoso de quando você vem,
Querendo fevereiro pra agora.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Flutuante

Seu amor é uma surra merecida; o beijo dá um branco na mente, como o cheiro de terra molhada que precede a chuva; quando seus olhos encurralam os meus, não tenho solução a não ser sorrir e ser todo seu. Uma pena que você tem essa tendência de me fazer esperar, de me deixar pro fluxo levar.

Leve você poderia ir longe, mas teima em viver querendo adivinha como a gente vai acabar, esquecendo que meu objetivo com você foi apenas começar, sem motivos pra pensar no que ainda virá, como se eu fosse um clima a ser previsto.
Previsões raramente dão certo, então pode voltar a chegar mais perto, mas faça rápido, você sabe, antes que eu siga adiante, não é que eu tenha pressa, todavia, percebi que não há motivos sãos pra me manter constante, darei o passo seguinte confiante, já que estou com essa mania nova de me manter flutuante.

sábado, 17 de setembro de 2016

Ateu

Não precisa muito, apenas um enigma dos tantos seus e sou fisgado a completar o quebra-cabeça que você me prometeu, comum sorriso tão ateu.

Ateio fogo em sentimentos tão bons, já que se não são consumidos, meu coração tende a descrê-los em textos que nunca serão lidos. Isso não é um conto de fadas, tampouco todos estão lhe apontando espadas, a boa verdade é que somos todos egoístas buscando relações não tão conturbadas, uma pena que eu goste tanto da crueldade do seu olhar e que eu seja tão complexo de se fazer bastar.
Bastaria, pra mim, que você admitisse que somos protagonista de um romance chinfrim, porque sim, eu quero seu ciúmes doentio, seu olhar frio, até mesmo suas queixas sem nexo e sem fio. É que eu quero você do jeito que é, sem estar atenuado após um bom café, tem vezes que você é bom, mas regularmente é médio ou ruim e está tudo bem ser assim, pelo menos pra mim.

Minimizo, portanto, qualquer esperança que sejamos retratados uma novela das nove. Não, somos reais, pungente, cheio de falhas, vítimas de joguinhos dignos de crianças, vez ou outra machucando um ao outro por vãs vinganças, mas humanos, acima de tudo. Odiaria que sequer sugeríssemos um tipo de amor de idealização, até porque essa nossa relação não tem dedo de Deus, é só um sentimento ateu, um que bem simples, sem juras, promessas, apenas vontade de eu ser sua, e você ser meu, enquanto nos for conveniente, é claro.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Disse Tanto

Se não queria cais,
Por que foi farol?
Pra quê atrair,
Se havia de sumir?

Você só me fez parar,
E depois parou de mim,
Decidiu me colecionar,
Como se eu fosse marfim.

Mas, se ainda há,
Alguma vontade de voltar,
Você sabe onde me encontrar;
Da minha vontade de ficar.

Se eu já não lhe era mais,
Por que me chamou de sol?
Pra quê desaparecer,
Se eu nunca tive você?

Eu lhe disse tanto:
-Pode ir embora,
Mas se chegar uma hora,
Em que deseje voltar,
Não hesita em me chamar.

Sim, estava aos prantos,
Mas é que pra mim,
Você tem esse ar santo,
E não consigo esquecer,
Todo o florescer,
Que você plantou em mim.

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Além de Ti

Obrigado por ter sido tão boa pra mim. Tu sempre viu tanta coisa boa em mim, não que eu não veja, mas acho que não tanto; não me lembro, por agora, de ninguém, além de ti, ter captado tanta coisa boa em mim. Lembro que sempre dizias que eu me achava. Sim, eu me acho, porém é que já encontrei o que gosto em mim e pra onde pretendo ir, seguindo sua interpretação de brincadeira ou não, realmente tenho uma boa estima por quem sou e o que almejo, como me porto e a forma que escolho pra seguir a vida, todavia não me vejo tão digno de um amor assim, ou de toda estima que tal sentimento emula. E ai nessa estimativa, criaste uma expectativa que eu nunca desejei. Não a culpo por isso. Algo em ti tinha esperança de achar um amor desses, até porque você é merecedora depois dos tantos calos que a vida lhe deu. E agora, olhando pra tudo isso, percebo o quão irônica a vida pode ser. É que se olhares no dicionário, vai ver que estimativa, expectativa e esperança são termos da estatística, a mesma palavra que tu fez questão de abominar e exemplificar que não queria que nos limitássemos a ser, quando, e se, não chegássemos ao tempo prevalecer.
Prevalece em mim a crença que a gente viveu algo maravilhoso, bom mesmo sabe? Se tirarmos as expectativas e olhar pras memórias e conversas profundas, a empatia tão rápida, vai ver que foi algo incrível. Então por que acumular a parte da suposição e macular tudo? Sei bem que ao chegar do inverno, poucas são as lembranças do verão, o gosto que fica é de outono e um anseio ávido pela primavera. Uma lástima, porque ao esquecer deles, optas por deixar ao relento dias bons que são tão meus quanto teus.

Tu é incrível, sabe disso, entretanto, às vezes, esquece. Não é ninguém que vai tornar tua vida boa, ninguém, além de ti. Eu amo sorrisos e os teus são tão lindos, tão bons de beber, tragar, admirar, roubar e contemplar; os que vem nos lábios, no olhar e, principalmente, no abraçar; contudo, ainda assim, os mais lindos sorrisos da minha vida são os que eu esboço, porque cada um é responsável pela felicidade que carrega, já que o sentimento se fórmula dentro de si. Tenho pra mim que a maior lição que tu pode tirar da gente é essa: tu é responsável pelo teu riso.

Ri do que foi bom, deixa de lado o peso, porque leve se flutua e se vai longe, se vai profundo. Pesado se prende, se mitiga, se desgasta e se imagina o que poderia ser, sem poder ou crer que não dá pra ser, perdendo a oportunidade do que já se é, do que já se tem, uma vida no presente pra se fazer de bem.